Jornal do Centro Cívico Ano 3 – Abril 2005 – Nº 27
Diretor-presidente: José Gil de Almeida
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Jornal Água Verde Ano 14 – Maio 2005 – Nº 285
Diretor-presidente: José Gil de Almeida
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BARCELONA E SUA INCRÍVEL IGREJA DA SAGRADA FAMÍLIA
Francisco Souto Neto
Igreja Expiatória da Sagrada Família.
No final da década de 70 desembarquei em Barcelona, na Catalunha, com um objetivo principal: conhecer a Igreja Expiatória da Sagrada Família, obra iniciada (e ainda inacabada) em 1884 por um dos mais controversos arquitetos de todos os tempos, e o mais importante da Espanha: Antoni Gaudí (1852-1926).
Decidido a construir a maior e mais inovadora catedral do mundo, e sabendo que a obra duraria séculos, ocorreu-lhe que a fachada leste – a Fachada da Natividade – deveria ser levantada antes das demais e completada ainda durante a sua geração. Assim, trabalhando nisso ao longo de ininterruptos 40 anos, viu os primeiros quatro campanários prontos, com a sua Porta da Fé, Esperança e Caridade, e sentiu-se satisfeito com a conclusão da primeira parte da obra.
Gaudí morreu aos 74 anos atropelado por um bonde, e as obras pararam. Somente após a Guerra Civil Espanhola, a construção foi retomada, mas muito lentamente, porque sem apoio governamental, apenas com doações dos visitantes.
Na minha primeira visita à Sagrada Família, a construção das quatro torres da fachada oeste já tinha alcançado o seu ápice, mas estava ainda em obras e a entrada se fazia pela Fachada da Natividade.
Galgando as alturas
Naquela ocasião, a igreja apresentava-se assim: de um lado, as quatro torres da fachada leste; do outro, as quatro torres da oeste... e todo o espaço entre tais fachadas estava a céu aberto, com grama no seu centro vazio! Eram, portanto, duas fachadas isoladas, monumentais em altura e beleza, mas que pareciam cenários de teatro.
Atrás, as quatro torres da Fachada da Natividade, e na frente as
quatro torres da Fachada da Paixão. Estas serão as duas
fachadas laterais. No futuro, a entrada principal será feita pela
Fachada da Glória, que ainda não existe.
Foto do começo dos anos 90.
Final da década de 90.
O elevador da torre da Natividade não estava funcionando, e eu me dispus a subir os 400 degraus para poder apreciar o panorama de Barcelona. Mais que isto, a escalada serviu para que eu pudesse observar o espetáculo visual sem precedentes da construção de Gaudí, e sentir de perto a magnificência das suas paredes de pedra.
Estive também na cripta, onde está Gaudí enterrado, e vi a maquete do que será a igreja quando pronta, com uma torre central ainda mais alta do que as anteriores, num desvairio de formas arquitetônicas que lembram a Natureza, tais como troncos de árvores e folhas... tudo em pedra. Lembro-me de que, naquela ocasião, embora ainda muito jovem e viajando com apertada economia, não resisti ao entusiasmo e emoção ante a beleza da obra, e fiz uma doação espontânea ao cofre da igreja, pensando: “quero ajudar na construção deste templo fantástico, nem que seja com o equivalente a uma modesta pequena pedra”.
A Fachada da Paixão
Só em 1991 retornei a Barcelona, agora na companhia do meu amigo Rubens Faria Gonçalves. E ambos logo rumamos à Sagrada Família. A Fachada da Paixão (lado oeste) já estava inaugurada, e por ali é que agora se fazia a entrada. Em oposição à outra fachada, original de Gaudí, onde é relatada na pedra a alegria do nascimento de Jesus, a nova fachada evoca desolação, dor, sacrifício e a morte de Cristo.
Em 1987, nomeado pela Junta de Construção, o escultor Josep María Subirachs começou a fazer a parte escultórica, mas impôs a condição de não imitar Gaudí para não manusear a sua obra, deixando claro aquilo que era criação do genial Gaudí (isto é, a Fachada da Natividade), e o que seria dos artistas dos tempos por vir. E deste modo as esculturas de Subirachs resultaram “descarnadas”... e polêmicas. Mas não são justamente a polêmica e a inovação que costumam movimentar a arte? A mim, o resultado pareceu interessantíssimo. Apesar da mudança de estilo das novas estátuas (pois Subirachs é nosso contemporâneo), está em harmonia com a arquitetura da igreja, que é toda de Gaudí. Quando for erguida a terceira fachada, que será a frente da igreja, lá pela metade deste século que está apenas começando, certamente algum artista – que talvez hoje não tenha ainda nascido – irá esculpir conforme os ditames do futuro.
Subimos os 400 degraus da torre, cuja altura equivale mais ou menos à de um prédio de uns 40 ou 45 andares. Imaginei que era a última vez que eu me dispunha a fazer tal esforço.
A visita de 2001
Em 2001 estive outra vez em Barcelona, e novamente com Rubens Gonçalves, meu velho companheiro de viagens. E é claro que logo acorremos à Igreja Expiatória da Sagrada Família.
A construção avançou muito. Agora as duas fachadas laterais estão unidas pelo teto da futura nave central do templo. Ficamos longamente observando o trabalho ruidoso dos construtores serrando grandes blocos de pedra e erguendo altíssimas colunas. Pensei, assombrado, que estávamos tendo o raro privilégio de acompanhar alguns dos passos da construção da “Catedral dos Pobres” – a Sagrada Família é também assim conhecida, porque vive e cresce de pequenas “esmolas” doadas pelo povo.
Vimos o local onde se erguerá a Fachada da Glória e a torre do domo central que, de tão alta (170 metros ) “tocará o céu”, equivalendo à altura de um prédio de quase 60 andares. Talvez seja concluída somente no século XXII, quando então deverá ser a maior igreja do mundo.
Provável aspecto da igreja quando estiver concluída.
Como de hábito, mais uma vez dispusemo-nos a subir as quatro centenas de degraus de uma das torres. A subida é muito divertida, cheia de paradas para observar a um ou outro detalhe. A meia altura, as torres intercomunicam-se através de uma ponte de pedra. As escadas espiraladas estão sempre coalhadas de turistas. Quando alguém ultrapassa, é preciso que o outro se encoste à parede para abrir espaço. Sobe-se por uma escada e desce-se por outra. Chegar ao alto da torre é tão maravilhoso que o turista logo se esquece do cansaço da subida.
Além de Gaudí
A Sagrada Família foi “apenas” a última construção de Gaudí. As obras do assombroso arquiteto espalham-se para além da Catalunha. Por exemplo, a Catedral de Palma de Majorca (onde estive há quatro anos) tem o altar projetado por Gaudí.
Além disso, Barcelona não é “somente Gaudí”. Trata-se de uma cidade riquíssima, a segunda da Espanha em população, que rivaliza com a capital daquele país em cultura e beleza. Eu, particularmente, gosto muito mais de Barcelona do que de Madri. Seus habitantes não se consideram espanhóis. Barcelona, capital da Catalunha (região que aspira se separar da Espanha) quer ser a capital do “país catalão”. Até língua própria eles têm, que é, obviamente, o catalão, e nem mesmo gostam de falar o espanhol.
Questões políticas à parte, eu penso mesmo é em um dia voltar a Barcelona para “fiscalizar” os progressos da construção e ter ainda vigor bastante para dispensar o elevador e subir os 400 degraus da extraordinária, esplendorosa e monumental Igreja Expiatória da Sagrada Família.
Estágio atual das obras, em 2011.
Pequena parte da igreja, consagrada pelo Papa em
sua viagem a Barcelona em 2011. No futuro, esta
será uma das capelas do imenso templo.
Fascinante teto, com incríveis colunas, da pequena
parte da igreja que já começa a funcionar.
Ilustração original: Aspecto atual da Igreja da Sagrada Família, com duas fachadas laterais já edificadas, totalizando oito torres.
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OBSERVAÇÃO: ADENDO EM 13 DE SETEMBRO DE 2011:
Agora com apoio do reino da Espanha, a Igreja Expiatória da Sagrada
Família deverá ser concluída nos próximos 20 anos.
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