terça-feira, 6 de setembro de 2011

Francisco Souto Neto: PRAGA, A CAPITAL DA REPÚBLICA TCHECA

Jornal do Centro Cívico Ano 3 – Outubro 2004 – Nº 20
Diretor-presidente: José Gil de Almeida

Página 9:


Capa:




 PRAGA, A CAPITAL DA REPÚBLICA TCHECA
Francisco Souto Neto


Com cerca de um milhão de habitantes, Praga (Praha) é a capital da República Tcheca, país formado em 1993, da divisão da antiga Tchecoslováquia. Fica na Boêmia e é, talvez, a mais bela das capitais europeias, com uma riquíssima arquitetura que impressiona até aos mais insensíveis.
Há mil anos, Praga já era uma cidade próspera. Durante a Idade Média, desfrutou de uma época de ouro, tendo se tornado grandiosa e maior do que Londres e Paris. Sob o reinado de Carlos IV (1347-1378) foi fundada a Universidade de Praga, a primeira da Europa. No século XVIII construíram-se magníficos palácios e igrejas barrocas. Com a Segunda Guerra Mundial veio a ocupação nazista; em seguida, o comunismo cerceou sua liberdade durante 40 anos. Só após a Revolução de Veludo, em 1989, Praga pôde renascer para o mundo em todo seu esplendor.

Rubens Faria Gonçalves entrando na Charles Bridge.

Francisco Souto Neto na Praça Staromestské, ao lado do
Relógio Astronômico de 1338. Ao fundo, a Igreja de Týn.

O Castelo de Praga e a Defenestração

Acima do bairro Malá Strana, situa-se o Castelo de Praga, gigantesca construção que ocupa cerca de 250 por 600 metros de extensão. Dentro de tal complexo, protegidos por alta muralha, estão localizados não somente a Catedral de São Vito, a Basílica de São Jorge e outras igrejas, como também o Palácio Real, o Palácio Lobkowicz e um convento, dentre inúmeros outros itens.
As obras da Catedral começaram em 1344 e foram concluídas por arquitetos e artistas dos séculos XIX e XX.
Quem nunca ouviu falar da Defenestração de Praga? Passeando pelos Jardins Reais, olhei para as janelas do último andar do palácio e me lembrei do episódio que aprendi no colégio, em aula de História: no dia 23 de maio de 1618, mais de cem nobres protestantes invadiram referido palácio, e após violenta discussão com os dois maus políticos que eram os governantes católicos chamados Jaroslav Martinic e Vilém Slavata, atiraram ambos, com o secretário Phillip Fabricius, pela janela leste. Os três resistiram à queda de quinze metros por terem caído em um monte de estrume. Os católicos atribuíram a sua sobrevivência à intervenção divina, mas o incidente deu início à Guerra dos Trinta Anos.

Alquimistas e Kafka

Na parte mais remota do Castelo de Praga localiza-se a Rua do Ouro, também chamada Rua dos Alquimistas. Estão ali pequenas casas encostadas à muralha do Castelo, onde moravam os guardas e arqueiros do rei. No século XVI passaram a residir naquele lugar os alquimistas, por ordem do próprio rei, para que estes fizessem suas experiências visando criar ouro... daí, o nome da rua. Na primeira metade do século XIX, essas pequenas habitações foram residências de estudantes pobres, e na casinha com o nº 22 pintado toscamente sobre a porta de entrada, morou o jovem Franz Kafka. Ali funciona hoje uma pequena livraria. Entrei, corri os dedos pelas paredes e fiquei pensando que aquele lugar tão singelo e apertado deve ter inspirado Kafka a escrever A Metamorfose, romance em que o escritor, transformado em uma gigantesca barata, passeia melancólico pelas paredes e teto do exíguo quarto. Atualmente as casas da Rua do Ouro são galerias de arte, livrarias e antiquários.

Francisco Souto Neto na Rua do Ouro nº 22,
na pequena casa onde residiu Franz Kafka.

Rubens Faria Gonçalves dentro da casa de
Franz Kafka, hoje uma livraria.

Atrações de Praga

As atrações culturais de Praga contam-se às centenas e é até difícil priorizá-las dentro de tamanha diversidade. Vão elas da extraordinária Ponte Charles, do Teatro Nacional de Marionetes, da Igreja de Nossa Senhora Vitoriosa e do Velho Cemitério Judaico, às praças Wenceslau e Staromestské, à Igreja de Týn, e a incontáveis outros locais.
O Velho Cemitério Judaico, por exemplo, foi o único lugar onde, durante 300 anos, os judeus podiam ser sepultados. Fundado em 1478, nunca pôde ser ampliado, de modo que, por falta de espaço, os mortos eram enterrados uns sobre os outros, em até doze camadas de sepulturas. No total, são mais de doze mil lápides que correspondem a cerca de cem mil mortos. O último judeu a ser ali enterrado, foi Moses Beck, em 1787. Numa sinagoga anexa, em memorial, estão os nomes dos tchecos mortos no Holocausto. Segundo se diz, durante a ocupação nazista Hitler mandou preservar o cemitério porque queria ele integrasse um museu que fizesse alusão “a uma raça extinta”. Hoje, em todo o complexo e arredores há cinco sinagogas, um Museu de Artes Decorativas e a Prefeitura Judaica do século XVI, que celebram a vitória da sobrevivência.

Souto Neto no Cemitério Judeu.

Noutro extremo da cidade, a Igreja Nossa Senhora Vitoriosa exibe a famosa estátua do Menino Jesus de Praga. Tal imagem, num altar lateral de ouro resplandecente, que se diz ser responsável por enorme número de milagres e curas, é uma das mais veneradas do mundo católico.
No centro da capital fica a Praça Wenceslau, chamada de “praça”, mas que é, na verdade, uma extensa avenida com largo jardim central, cercada de alguns dos mais belos edifícios art-nouveau do mundo. Na Segunda Guerra Mundial, os tanques de Hitler desfilaram nessa praça; em 1969 aconteceu naquele lugar a Primavera de Praga e, em 1986, a Revolução de Veludo. Quem, da minha geração, não se lembra do estudante Poloch imolando-se ali em fogo, e morrendo pela liberdade do país? No lugar onde isto aconteceu, bem no meio do jardim ao centro da praça, o povo mantém velas acesas. Quando vi as pequenas chamas, logo percebi que homenageavam a memória dos dois rapazes que foram “vítimas do comunismo”. Duas fotografias de ambos, protegidas por um plástico improvisado, estão colocadas sobre a grama. Filmei um pouco daquele clima de consternação e fiquei observando as velas bruxuleantes ao vento, e as expressões sensibilizadas dos turistas que reverenciavam a História.

Rubens Gonçalves na Praça Wenceslau.

Souto Neto na Praça Wenceslau, no lugar onde morreram
os dois jovens estudantes em 1969, "vítimas do comunismo".

Homenagem aos dois mortos que se imolaram,
"vítimas do comunismo", como lembra a placa.

Haveria muito mais a dizer sobre Praga, mas este texto não teria fim. E é bem esta a realidade das cidades europeias de passado muito extenso e história extremamente rica...

-o-


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