Jornal Água Verde – Ano 14 – Abril 2005 – Nº 284
Diretor-presidente: José Gil de Almeida
Página 14:
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Jornal Centro Cívico – Ano 3 – Maio 2005 – Nº 26
Diretor-presidente: José Gil de Almeida
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CRETA, LABIRINTO E MINOTAURO
Francisco Souto Neto
Creta é a maior ilha da Grécia, com 8.336 quilômetros quadrados, situada no Mar Mediterrâneo oriental, com cidades de grande importância histórica e cultural, onde vivem mais de meio milhão de pessoas.
Da capital de Creta, Iráclion (ou Heraclion), alcança-se facilmente a maior atração da ilha, que são as ruínas de Cnossos (ou Knossos), lugar onde, há mais ou menos 4.000 anos, floresceu a civilização minóica. Anterior aos gregos, o povo minóico conheceu um nível de sofisticação e magnificência que é considerado como a fonte de inspiração da cultura europeia.
Por volta do ano 1.450 a .C. (portanto, há aproximadamente 3.455 anos!), a explosão vulcânica de Santorini – uma ilha mais ao Norte – provocou um terremoto seguido de maremoto ou tsunami, que destruiu completamente a civilização minóica, alterando para sempre a história do nosso planeta.
Cnossos vem sendo escavada e suas ruínas parcialmente reconstruídas desde o início do século XX. Essa reconstrução talvez não obedeça a um verdadeiro rigor histórico. Seja como for, já é possível passear pelo grande palácio que se chama Labirinto, o lugar onde nasceu a lenda do Minotauro de Creta.
Ruínas do Palácio de Cnossos, ou Labirinto.
Souto Neto sobre o Palácio de Cnossos, ou Labirinto.
Planta do Labirinto de Creta, isto é, o Palácio de Cnossos.
Tauromaquia e seios nus
Pinturas murais e mosaicos que resistiram ao terremoto atestam que a tauromaquia (a arte de tourear) era mais ritualística do que esportiva, e mostram-nos jovens saltando por sobre o dorso de touros. Esses animais, os touros, eram mortos ritualisticamente, mas a carne consumida, enquanto os ossos eram enterrados em grandes fossos, com fins religiosos.
Neste mural de Cnossos, três homens praticam a tauromaquia.
Um deles está saltando sobre o touro.
O padrão de beleza, tanto para mulheres quanto para homens, era a “cintura de vespa”. Tudo indica que os minóicos não eram guerreiros, mas integravam uma sociedade voltada à arte e à beleza. As mulheres vestiam-se suntuosamente, mas todas elas, da rainha e das esposas dos políticos mais influentes, até às mais humildes servas, deixavam os seios nus.
Este mural mostra três mulheres minóicas com seus
elaborados penteados e os seios nus.
Provavelmene uma princesa monóica, com
os seios nus, seguida por alguns súditos.
Um príncipe minóico. Mural em Cnossos.
O palácio de Cnossos, ou Labirinto, e era enorme, com mais de mil quartos, incontáveis salas e centenas de intrincados corredores, desfrutando do conforto de um bem elaborado sistema de drenagem, banheiras, e até vasos sanitários com descargas, algo inimaginável em qualquer outra parte do mundo há cerca de 3.500 anos! Foi a partir do Labirinto de Creta que a palavra “labirinto” se tornou o substantivo comum que se designa aquilo que todos conhecemos.
É fácil começar a compreender a lenda do Minotauro da mitologia, que habitava o Labirinto, porque os reis de Cnossos chamavam-se Minos, e o touro, ou taurus, era cultuado. Assim, Minos e taurus derivam para a palavra e o mito do Minotauro.
Minotauro e Labirinto
Visita-se Cnossos em grupos guiados. Fazendo parte de um destes, lembro-me claramente da expressão divertida da guia, uma senhora opulenta com uns 40 anos, quando, após termos percorrido os exteriores, disse ela a todos: “E agora fiquem bem próximos, não se afastem de mim e não percam ninguém de vista, porque vamos entrar no Labirinto de Creta!”. Ela fazia alusão à lenda, segundo a qual o Minotauro era um ser monstruoso, metade homem e metade touro, nascido de Pasifae (mulher do rei Minos) e de um touro branco enviado pelo deus Posêidon (ou Posseidon). O rei Minos, furioso com a traição da rainha, aprisionou no Labirinto o filho-monstro de Pasifae. O Minotauro alimentava-se somente de carne humana, e a cidade de Atenas (que era, efetivamente, uma colônia de Cnossos) foi condenada a pagar um tributo anual de sete virgens e sete rapazes que eram dados ao monstro. Finalmente, o Minotauro foi morto por Teseu, um dos jovens enviados para o sacrifício. Teseu poderia passar muitos anos dentro do Labirinto, talvez toda a vida, sem encontrar o caminho de volta, porque, sem a ajuda de uma guia como a minha – aquela senhora opulenta à qual me referi há pouco – a saída do Labirinto poderia ser uma vã esperança. A sorte foi que Ariadne, filha do rei Minos, apaixonada por Teseu, deu a ele o fio que o ajudou a sair do Labirinto logo após matar o Minotauro.
Sala do trono do rei Minos, no Labirinto de Creta.
Quarto da rainha de Cnossos. Ela estava trocando a decoração
da parede (observar friso sob os golfinhos), quando o terremoto
seguido de tsunami destruiu a civilização minóica.
Quando estávamos num dos subterrâneos, a guia do meu grupo de visita apontou a uma parede em forma de grade, cuja porta estava fechada com cadeado, e disse a todos que ali, segundo a lenda, era a cela do Minotauro. Bem-humorada, ela brincava com os turistas. E logo foi afastando-se, seguida por todos. Eu cheguei bem junto à grade e olhei através dela para a obscuridade do enorme cômodo vazio, pensando não na lenda do Minotauro, mas na maravilha da civilização minóica que, por ter sido destruída numa catástrofe natural, deve ter atrasado o avanço da civilização por milênios. Havia um vento encanado que, naquele silêncio, começou a assoviar... Era um assovio grave, quase um sussurro. Seria, talvez, como um mugido distante... Afastei-me da grade e apressei o passo na direção em que o grupo havia há pouco desaparecido. Logo ouvi as vozes das pessoas e, ao alcançá-las, desperdicei a rara oportunidade de ficar perdido – para sempre? – no Labirinto de Creta.
-o-
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